Quem é mais antiguinho como eu, lembra da Concordata. Não sei quem tinha mais medo dela: a empresa que pedia ou o seu credor. Para quem não lembra, a Concordata existiu até 2004 e consistia no seguinte: uma empresa que devia para credores e não possuía condição de pagamento, podia pedir juridicamente a Concordata e assim ficava dois anos sem pagar nada e sem poder ser processada ou cobrada. Os próprios donos continuavam tocando a empresa e decidindo as estratégias nesse período. Passados dois anos, a empresa deveria pagar os credores ou pedir falência. 80% das empresas iam à falência.

Como nada se cria, tudo se copia, nosso eficiente governo, descontente com o cenário de tantas falências, resolveu copiar o padrão Americano. Estudiosos de plantão no Planalto perscrutaram a legislação americana e encontraram a Chapter 11, que seria a forma de Concordata deles, e a traduziram para Recuperação Judicial. Constataram também que, lá, 30% das empresas obtinham êxito na recuperação de seus negócios.

Nascia, em fevereiro de 2005, a Recuperação Judicial, que, diferentemente da Concordata, possui as seguintes características:

  • A empresa que pede Recuperação Judicial fica imune de pedidos de falência por 180 dias;
  • Nesse período, a empresa é comandada por um Administrador Judicial;
  • A empresa deve apresentar, nesse período, um plano de recuperação aos credores;
  • Se os credores aprovarem o plano, a empresa deve executá-lo fielmente; e
  • Se os credores rejeitarem o plano, é decretada a falência da empresa.

Passados 9 anos da sua implantação, a Recuperação Judicial é um sucesso? Conseguimos os índices americanos?

Vejamos:

Nesses 9 anos, mais de 4.000 empresas pediram Recuperação Judicial. Apenas 45 conseguiram se recuperar e sanar suas pendências. Isso representa 1% de êxito das brazucas contra os 30% dos americanos.

concordataConclui-se facilmente, assim, que o problema não é o modelo de recuperação, e sim as condições que o governo propicia para as empresas prosperarem. Aqui não temos governo. Há um caos tributário, fiscal e trabalhista. Não investimos em infraestrutura e muito menos em educação. Temos uma das maiores taxas de juros do mundo e uma inflação latente e maquiada. Cada empresa despende mais de 3 mil horas anuais para apurar impostos, em um sistema complexo e oneroso. Mais de 70 milhões de brasileiros recebem do governo sem nada fazerem, e, por isso, os que produzem pagam uma das maiores cargas tributárias do planeta para sustentar esse modelo piegas e demagogo.

Outra coisa que é diferente entre o Brasil e os EUA é a pesquisa de mercado. Diferentemente dos nacionais, os institutos de pesquisa americanos são conceituados e respeitados. Um deles, o Pew Research Center, faz pesquisas frequentes em mais de 80 países e, em abril, fez uma pesquisa com mais de mil pessoas aqui no Brasil. Alguns dos resultados já publicados:

  • 72% estão insatisfeitos com a situação do país;
  • 67% consideram a atual gestão econômica nacional ruim;
  • 85% estão insatisfeitos com o aumento de preços e inflação;
  • 83% rejeitam a criminalidade;
  • 83% repudiam o atendimento médico;
  • 72% não encontram empregos condizentes;
  • 63% não aprovam a condução da Dilma na solução dos problemas econômicos;
  • 86% desaprovam sua condução perante o quesito corrupção;
  • 75% rejeitam a preparação da Copa;
  • 61% consideram a Copa ruim para o país; e
  • 75% reprovam o governo nacional.

Se prosperar num cenário desses já é difícil para uma empresa estável, imagine para uma empresa tentando uma Recuperação…

Resolvi escrever esse artigo mostrando as discrepâncias entre a Recuperação Judicial entre os dois países, pois, justamente nesse mês, o empresário Eike Batista, que pediu Recuperação Judicial no final do ano passado, conseguiu que a maioria dos credores da OGX, hoje denominada Óleo e Gás, aprovasse os termos de Recuperação Judicial. Os credores assumirão o controle da empresa e Eike terá sua participação reduzida para 5%.

Só me resta rogar que as pessoas que disseram que o Eike era um exemplo espetacular de empresário tenham, nas urnas, esse mesmo percentual de votos.

Marco Antonio Pinto de Faria

Bacharel em Ciências Contábeis, Administrador de Empresas, Auditor, Presidente e Fundador do Grupo SKILL composto por empresas atuantes no mercado há 40 anos, oferecendo serviços de Consultoria Tributária, Contabilidade e Tecnologia da Informação. Integrante do IBRACON – Instituto dos Auditores Independentes do Brasil.


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